quinta-feira, 25 de junho de 2009

Temporada de caça



Temporada de caça
Lucia Sauerbronn
Como boa representante do sexo que enlouquece em tempo de liqüidação, confesso que já torci para minha vizinha de provador desistir de um vestido, que acabei comprando por uma bagatela. O modelo é lindo, apesar de um pouco apertado. Se perdesse uns quilinhos, talvez arriscasse usá-lo. O problema é a cor, entre o azul desbotado e o verde-amarelado. Há anos vive pendurado no armário, com etiqueta e tudo.
Tive, com uma calça de lã xadrez, um caso de amor à primeira vista. Nem me importei com o fato de ser dois números acima do meu. Apesar dos esforços da costureira em transformar um 44 em 40, cada vez que tento vestir, desisto: pareço um saco de batatas amarrado pela cintura.
No calor da emoção, certa vez não resisti a um adorável par de sapatos pretos de bolinhas brancas. No mesmo dia, usei numa festa. Eram lindos, me senti maravilhosa. Passei cinco horas sentada, com os pés 35 espremidos no tamanho 34, amargando a dor que subia da ponta dos dedos ao topo da cabeça. Guardei os sapatinhos de Cinderela na caixa. Não consegui esquecê-los nas quatro semanas que levei para curar os calos e bolhas que eles provocaram.
Cada vez que termina uma estação e o preço das roupas e sapatos cai pela metade, as mulheres são tomadas por uma compulsão consumista. Saímos à caça de pechinchas que antes custavam uma fortuna.
Li outro dia que uma dessas lojas famosas, que só vendem roupas de grife, anunciaram um sale (nome sofisticado para uma queima geral de estoque) e colocaram à disposição das clientes carrinhos de supermercado. Imagine centenas de mulheres arrancando as peças das araras e jogando no monte, com a sensação de que estavam fazendo um negócio da China: jeans de oitocentos por quatrocentos reais; bolsas de quatro mil pela metade do preço, sandálias por apenas três parcelas de trezentos!!! O resultado dessa farra toda são mulheres que parecem vitrines ambulantes, exibindo logotipo até na calcinha.
O chato das grifes é que, de um ano para outro, o estilo muda completamente. Já comprei um maiô estampado de marca famosa por um precinho bem bacana, pensando em arrasar no verão seguinte. Quando desfilei na piscina, ouvi o comentário maldoso de que aquele modelo tinha sido o maior sucesso da coleção passada.
Qualquer mulher sabe que, no meio da loucura, é preciso agir rápido, antes que uma adversária descubra aquele casaquinho de renda chiquérrimo. Você arremata a peça, pensando que ela será muito útil caso seja convidada para um baile de gala da rainha da Inglaterra. Contaminada pelo vírus da promoção, não é difícil errar a mão e comprar roupas que não têm nada a ver com o próprio estilo. Frente a frente com um justíssimo vestido vermelho de cetim, até a mais recatada senhora calcula que talvez seja hora de arriscar uma mudança radical e se transformar numa perua sexy.
Diante de uma oferta de 50% off, novo apelido para a mesma velha liqüidação, às vezes a gente exagera. Tenho uma amiga que comprou quatro pares de sapatos idênticos, mas de cores variadas, porque estavam tão baratinhos! Liqüidação tira qualquer mulher do sério, a ponto de estourar os limites do bom-senso e do cheque especial.
Depois de passar pelo caixa, deixar a loja cheia de sacolas com ar triunfante, a excitação acaba e a gente sai do transe. Aí bate o remorso. Conheço mulheres que escondem tudo na casa da mãe e vão usando uma peça por vez, para o marido não desconfiar. Como se, mais dia, menos dia, não fossem traídas pela conta do cartão de crédito.
Além de paixões repentinas por peças de gosto duvidoso, meu problema com as liqüidações é que não tenho paciência para esperar um provador vazio. Só em casa é que percebo a besteira. Se ficou justo, nunca tem tecido suficiente para alargar. Se o caso for apertar, a roupa perde o corte, fica desajeitada, deselegante. Como nem sempre deixam trocar, vou entupindo o armário com coisas inúteis.
Este ano, fiz um balanço das peças em promoção que comprei, mas jamais usarei. Resolvi me prevenir. Para evitar cair na tentação, fui às compras antes que as lojas anunciassem suas ofertas imperdíveis. Escolhi um pretinho básico, uma boa camisa branca, uma calça de corte impecável e um par de sandálias de tirar o fôlego. Na semana seguinte, tudo estaria pela metade do preço. Mesmo assim, garanto que fiz a maior economia.
Crônica publicada na Coop Revista - Fevereiro / 2008

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