quinta-feira, 25 de junho de 2009

Bei Jing Huan Ying Ni*



Bei Jing Huan Ying Ni*
Lucia Sauerbronn
A China fica bem embaixo do Brasil. Se a gente abrisse um buraco que varasse o mundo, era capaz de cair na Cidade Proibida, onde os imperadores viveram por seis séculos e que é o lugar mais bonito da China. Embora morem do outro lado do planeta, é claro que os chineses não andam de cabeça para baixo. Mas que por lá tudo é ao contrário, ah! isso é mesmo. Por exemplo: lá, hoje é amanhã e amanhã hoje foi ontem.
Na China todos os dias nascem milhares de bebês de olhinhos puxados, o que leva a gente a pensar que os chineses são todos iguais. Na verdade, eles também acham que nós, ocidentais, somos todos iguais por causa do nosso nariz grande. E tem mais: 91% da população pertence à etnia Han, e o resto se divide em 55 outras etnias – que eles chamam de minorias – e têm traços muito diferentes.
A língua oficial deles é o mandarim. Mas as minorias juntas falam outros oitenta dialetos e línguas! Aprender chinês não é fácil porque, para piorar, cada vogal tem quatro entonações, o que muda completamente o sentido da palavra. Por exemplo, se alguém disser ma..., pode estar chamando a mãe. Mas, se alguém disser má!, não se espante se ele estiver apontando um cavalo. Ainda bem que, como em qualquer parte do mundo, muito chinês já fala inglês.
O legal é que, apesar dessa confusão toda, a maioria das palavras se escreve do mesmo jeito. É que o chinês não tem alfabeto, mas ideogramas, que são desenhos cheios de riscos e tracinhos que juntos exprimem uma idéia. Isso poderia representar uma grande economia de papel. O problema é que, para se expressar através da escrita, o chinês pode usar mais de 50 mil caracteres diferentes. Mas quem conseguir aprender uns 5.000 já pode quebrar o galho...
Antigamente, as famílias eram muito numerosas e não costumavam pôr nome nas crianças, para evitar que os maus espíritos viessem roubá-las. Eles chamavam de primeiro filho, segundo filho, e assim por diante. Hoje cada casal só pode ter um filho, por isso eles às vezes têm nomes estranhos como Ímpar. Os pais torcem por um menino para dar continuidade ao nome da família.
Lá é tudo tão ao contrário que o sobrenome vem antes do nome. E eles não são muito criativos. Existem 93 milhões de pessoas com o sobrenome Li, outros 93 milhões são Wang, dando a impressão de que todos são parentes. É como se metade dos brasileiros chamassem Silva e a outra metade, Santos. Só que, assim como os Silva e os Santos, os Li e os Wang representam apenas um oitavo da população chinesa, que é de 1 bilhão e trezentos milhões de pessoas.
Alimentar toda essa gente não é bolinho. Por isso, tudo o que voa e não é avião, tudo o que anda e não é carro e tudo o que se move na água e não é barco pode acabar na panela. Eles comem coisas estranhas como escorpiões fritos e cavalos-marinhos assados, iguarias que acham tão saborosas como são para nós os rabos, pés e orelhas de porco que fazem parte da nossa feijoada.
A refeição na China é um momento de união. Ninguém come sozinho. As pessoas sentam em torno de uma mesa giratória e, usando pauzinhos, vão se servindo dos pratos coloridos com legumes e verduras, carne de vaca, porco, frango, pato. Ao invés de refrigerantes, eles preferem tomar chá, que ajuda a digestão.
A China existe há quase 6.000 anos. Foi lá que inventaram o macarrão, o sorvete, o papel, a porcelana, a seda, o guarda-chuva, a bússola, a pólvora, o arado, o carrinho de mão e até os óculos do sol. Inventaram também o dragão, um bicho que não existe, mas está em toda parte.
Durante 23 séculos, quem mandava na China eram os imperadores. Há 60 anos são os comunistas. Mas, desde que o líder Deng Xiaoping declarou que “enriquecer é glorioso”, os chineses são mesmo consumistas.
Por isso, o dragão, que representa o poder do fogo que destrói para permitir o nascimento do novo, nunca teve tanto trabalho. Prédios velhos estão virando cinzas, dando lugar a praças e jardins floridos, avenidas largas e edifícios ultramodernos. Em cidades como Pequim (ou Beijing, como eles dizem), o número de carros (quase 3 milhões e meio) já superou o de bicicletas, e juntos produzem um congestionamento dos diabos. Eles também trocaram o som dos grilos, que traz sorte, pelo dos celulares, que não param de tocar. É claro que nem toda a população da China pode comprar tudo isso. Mas, assim como no Brasil, um país de grandes diferenças sociais, a qualidade média de vida por lá anda melhorando rapidamente.
Para os chineses, os números exercem grande influência na vida. Ao invés do 13, eles acham o 4 azarado, pois tem o mesmo som do verbo morrer. Até outro dia, os números mais importantes eram o 6 (da calma e da suavidade) e o 9 (da longevidade). Na nova China, o predileto agora é o 8, símbolo de riqueza e prosperidade.
Os chineses levam os números tão a sério que os Jogos Olímpicos de Pequim vão começar às 8 horas e 8 minutos do dia 8 do mês 8 de 2008. Vai gostar de prosperidade assim lá na China!
* Bem-vindo a Pequim
Crônica publicada na Coop Revista - Julho / 2008

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